A tia Leonor do Massapez era uma figura de mulher sabedora da vida e sabedora dos meandros do comércio agrícola. Era vê-la na época das canas a contratar pessoal, a controlar os molhos de cana e o horário de carga dos velhos Fargos do tio Federico. Nunca casou. Era uma espécie de matriarca.
Vivia, sozinha numa casa térrea, afastada da rocha por um corte vertical feito no salão que suportava o negro basalto, onde uma cabra se recolhia numa furna sobranceira ao telhado feito de telha branca de cimento em cujos cantos adejavam petrificadas pombinhas. Ao lado cacarejavam as galinhas pretas e de boa postura e reinavam uns galos bodiões de crista altiva, cujo canto despicado se estendia largo pelas manhãs.
Frente à casa cresciam goiabeiras, nespereiras, araçaleiros e um mangueiro que ficava amarelinho de frutos suculentos. O terreiro era calcetado de pedra lascada e fronteado por blocos de pedra que serviam de assento ou de apoio a enormes vasos com orquídeas. Junto às paredes rebocadas da casa cresciam algumas begonaceas conhecidas por corações. As portas de madeira maciça estavam pintadas de verde e duas janelinhas serviam de entrada à luz. O quarto compunha-se de uma cama de solteira suportada por um catre de ferro. Uma mala, a um canto servia de arrecadação dos bens mais escassos e, nos seus escaninhos, ela guardava documentos e algum dinheiro. Um vestuário castanho ficava noutro canto, e ao lado da porta estava a bacia da higiene na sua armação típica de ferro, em cujo varão superior pendia uma toalha branca de linho.
No outro quarto, mais pequeno, guardava os pequenos barris de vinho, algumas batatas, milho em maçarocas, trigo e o feijão. Num canto, bem arrumadas, estavam as alfaias da agricultura: enxadas, podoas, foices, o podão da vinha, cajados para aliviar os pesados molhos de cana, apertados por negros arcos, cabos de nespereira para as enxadas que cavam o pegajoso massapez....
No fim do verão o meu avô descia das Eiras, bem cedo, passava pelo Pardieiro, onde, geralmente, encontrava o Ferreira ou outro agricultor, depois subia ao Arrudal, atravessava o caminho das Levadas, calcetado toscamente nessa época, e puxava dum cigarro no Cabeço, junto à casa do Coelho, seu amigo de longa data.
Dali já se via a casa da Tia Leonor. Os araçais esperavam, gordos e amarelos nas árvores, e até as uvas americanas que sombreavam o terreiro de mil fantasmas derretiam-se em cheiro. A tia já tinha figos passados nos açafates de cana, pendurados na cozinha de terra batida, afastados do lume que encardia a parede áspera do fundo por onde se escava o fumo.
O avô descia calmo e sabedor dos atalhos, pelos lanços ladeados de canas jovens, precisando de desfolha, depois serpenteava pela lavadinha, e passava junto do poço do Tasqueira, sobre o qual uma romãzeira, prenhe de verdes frutos, se oferecia ao abismo. Uma amendoeira dava as boas vindas à casa da tia por aquelas bandas. Uma breve cancela se abria e logo se fechava, não fossem as galinhas chocadeiras desaparecerem com os pintainhos.
Eu chegava acompanhado do avô e logo beijava a mão da tia-avó e dizia:
-Tia, sua bênção.
Ela sorria e respondia com a sabedoria da vida:
-Que Deus te abençoe e te faça melhor que a tia.
Depois a vida mudou e ela foi viver para a vila. Na rua das Rosas.
Ali tinha mais tempo para as suas leituras e pode viver a sua reforma com tranquilidade. Por detrás dos seus grossos óculos vivia sempre um sorriso de criança. esse era o seu maior segredo para cativar os meninos, ao qual se adicionava um rebuçado de funcho. Desse tempo recordo a sua voz rouca e pausada, o cheiros das beberas passadas, e dos peixinhos vermelhos que nadam num pequeno pocinho, como eu nadava despreocupado e crescia.
A casa ainda lá está, e nas suas paredes, já sem cor, moram as minhas memórias de criança.
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Como é doce esse recordar, esse lembrar de coisas, pessoas importantes da infância, e mais ao som da voz de Max, esse artista grande sendo médio, grande talento, ironia, saber... vim conhecer seu cantinho e me apaixonei, vou voltar acredite.
ResponderEliminarParece que te vejo quando criança, ou melhor, te revejo. Revejo também a casa da minha avó e tudo o que nela há da minha vida. A casa em si já não existe. Parabéns********
ResponderEliminarUm beijo, meu amigo.
Em algum lugar acima do arco-íris
Lá no alto,
Há uma terra, de que certa vez ouvi falar
Numa canção de ninar.
Em algum lugar acima do arco-íris
Os céus são azuis,
E os sonhos que se ousam sonhar
Se realizam de verdade.
Um dia pedirei a uma estrela
Que me desperte longe das nuvens
Atrás de mim.
Onde os problemas se derretem
Como pastilhas de limão
Longe, acima do topo das chaminés
É lá que tu me vais encontrar.
Em algum lugar acima do arco-íris
Os pássaros azuis estão a voar.
Os pássaros voam acima do arco-íris.
Por que, ah, por que não posso eu voar?
Se os pássaros azuis voam felizes
Acima do arco-íris
Por que, ah, por que não posso eu voar?
Tradução interventiva da Renata
Renata
Posso usar este ou outro texto nas aulas? Conheço poucos com descrições tão ricas (espaços e personagens).
ResponderEliminarPodes usar os que quiseres, desde que corrijas as imprecisões.
ResponderEliminarVamos Sonhar, Jordas?
ResponderEliminarConosco há sempre uma força invisível, um anjo que nos orienta, nos impele constantemente para frente*
Tagore
Não me procures
É só um momento
Eu só me perco
No espaço e no tempo
Acalentada pelo lume de Deus
Com a minha pele multicores
Eu danço giro em meio às flores
Emitem ondas de luz o corpo meu
Acima das nuvens
Além das tormentas
Sempre sinto a estranha
Necessidade de sonhar
Leva-me ao Paraíso
No meio das árvores
Aqui não há espinhos
Nas flores e nas rosas
Lá frutas impenetráveis
Tapetes verdinhos
Esse canto de Paraíso existe
Eu tenho a certeza.
By Renata Cordeiro
Agora, vou sair pra andar.
Mais um beijinho
Rê
Vim trazer aquela canção nossa e desejar-lhe um Bom Domingo, meu amigo.
ResponderEliminarBeijinhos
Amigos para sempre**
Eu não tenho nada pra dizer
Você parece no momento até saber
Como, quanto estou sofrendo
Venha ver pelos olhos meus
A emoção que sinto em estar aqui
Seguir seu coração e amando
Amigos para sempre
É o que nós iremos ser
Na primavera
Ou em qualquer das estações
Nas horas tristes
Nos momentos de prazer
Amigos para sempre
Você pode estar longe
Muito longe sim
Mas por amá-lo
Sinto você perto de mim
E o meu coração contente
Não nos perderemos
Não o esquecerei
Você é minha vida
Tudo que sonhei
Ligue-me qualquer dia
Amigos para sempre
É o que nós iremos ser
Na primavera
Ou em qualquer das estações
Nas horas tristes
Nos momentos de prazer
Amigos para sempre
Amigos para sempre...
Vários compositores, remexidos há um tempinho pela Renata Cordeiro.
Da Rê para o Jordas.
Obrigado Renata pelo teu cuidado.
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